O Saara antes de se tornar o maior deserto do planeta
As muitas Teorias
O
que hoje é o árido, quente e inóspito deserto do Saara, no norte
da África, era uma região de savanas e pradarias com alguns
bosques, lar de caçadores e coletores que viviam de vários animais
e plantas, sustentados por lagos permanentes e muita chuva.
Era
assim numa época entre 5 mil e 10 mil anos atrás - período
conhecido como do "Saara verde" ou "Saara úmido".
É
difícil imaginar que o maior deserto quente do mundo, que tem uma
precipitação anual entre 35 e 100 milímetros de chuva, recebia
chuvas 20 vezes mais intensas há alguns milhares de anos.
Os
ventos das monções sazonais traziam intensas chuvas que mantinham a
terra fértil.
Existem
diferentes estudos que reconstituem o clima e a vegetação do Saara
nos últimos 10 mil anos.
Um
dos mais recentes, publicado em conjunto por pesquisadores da
Universidade de Estocolmo, na Suécia, e das universidades de
Columbia e do Arizona, nos Estados Unidos, analisou a sedimentação
marinha no norte da África em busca de um padrão de chuvas.
A
precipitação anual no Saara Ocidental pode ter sido até 2 mil
milímetros maior do que é hoje em dia, com vegetação parecida com
a da atual região sul do Senegal, segundo
estudo.
O
Senegal, na costa oeste da África, faz parte do Sahel, uma faixa de
500 a 700 km de largura, em média, e 5,4 mil km de extensão,
protegida por um cinturão verde de flora altamente diversificada,
que a protege dos ventos do Saara. É uma zona de transição entre o
deserto do Saara no norte e a savana sudanesa no sul, que se estende
do oceano Atlântico até o mar Vermelho.
O
Sahel atravessa a Gâmbia, o Senegal, a parte sul da Mauritânia, o
centro do Mali, Burkina Faso, a parte sul da Argélia e do Níger, a
parte norte da Nigéria e de Camarões, a parte central do Chade, o
sul do Sudão, o norte do Sudão do Sul, a Eritreia, a Etiópia, o
Djibuti e a Somália.
Acredita-se que os animais que hoje em dia pastam no Sahel, como os gnus e as
gazelas, possam ter vivido até no extremo norte do Saara Ocidental.
A
parte oriental podia ser um pouco mais seca, mas com pastagens acima
da região do paralelo 25 Norte (no norte da Mauritânia). Outros
pesquisadores, porém, mencionam uma vegetação mais frondosa, com
árvores e lagos onde viviam grandes animais e
a
evidência fóssil e de pólen é bastante clara.
Havia
no Saara corpos hídricos permanentes, savanas, pradarias e até
alguns bosques. Foram
encontrados fósseis de grandes animais que hoje já não são vistos
vivos no Saara. Crocodilos, elefantes e hipopótamos.
Assentamentos
humanos antigos também deixaram evidências da existência de uma
grande fauna. Vemos a arte rupestre representando girafas no meio do
Saara. Ali também encontramos antigos anzóis, o que sugere um estilo
de vida profundamente diferente de como se viveria atualmente nesta
parte do deserto.
Nos
poucos e muito isolados corpos hídricos que ainda existem, há
peixes das mesmas espécies, que não tiveram qualquer forma moderna
de contato. Isso
sugere que, no passado, existiam vias aquáticas que se comunicavam.
Embora
seja muito difícil determinar a extensão dessa vegetação,
estima-se que o cenário descrito tenha se estendido muito ao norte
do Saara, onde hoje estão as regiões centrais da Líbia, da Argélia
e do Egito.
Este
clima - favorável à existência de uma flora fértil e fauna e o
desenvolvimento humano, foi desencadeado pela maior proximidade do
Sol em relação à Terra durante o verão, o que produziu mudanças
de insolação.
O
Saara se tornou verde quando saímos do período glacial. O Sol do
verão se tornou mais forte há uns 9 mil anos e isso trouxe uma
série de consequências.
Quando
o Saara esquentou, as chuvas de monções se tornaram mais fortes, o
que levou a uma vegetação maior que, por sua vez, reduziu as
emissões de poeira e diminuiu o reflexo da luz, promovendo mais
precipitações.
Este
reflexo de luz solar, seja da superfície terrestre ou da poeira que
flutua na atmosfera, é conhecido como albedo e é um dos fatores
mais importantes na aridez de uma região.
Esse
intenso albedo, a luz de cor creme clara refletida na superfície do
deserto e também com alto teor de partículas minerais, contribuiu
para a desertificação do Saara.
Quais
foram os fatores e como ocorreu a dramática transformação dessa
região no vasto e empoeirado deserto que conhecemos têm sido objeto
de debate da comunidade científica. Muitos cientistas concordam que
a mudança ocorreu há 5 mil anos, como fruto de um fenômeno cíclico
de maior ou menos insolação.
É
algo que ocorre mais ou menos a um intervalo de 20 mil anos, segundo
mudanças na órbita da Terra. Mas, em quanto tempo o Saara se tornou
árido está sendo investigado.
Uma
das teorias sustenta que o Saara passou de verde a deserto
subitamente, em um par de séculos, numa das mudanças climáticas
mais dramáticas da Terra.
Outra
pesquisa, publicada em maio de 2008, estima que a região tenha se
tornado o deserto mais quente do mundo há apenas 2,7 mil anos e que
a mudança foi muito mais lenta.
Com
os dados analisados, eles construíram uma história geológica que
sugere um processo gradual de desertificação que continua até o
dia de hoje.
Esta
pesquisa data o deserto em 2,7 mil anos, mas estima que os seres
humanos tenham abandonado as áreas que estavam se tornando
desérticas muito antes, à medida em que o clima mudava.
Por
sua vez, outro estudo do qual participou, analisou as precipitações
passadas e concluiu que seres humanos caçadores e coletores povoaram
o Saara verde e o abandonaram há uns 8 mil anos, devido a um período
de seca que durou mil anos.
Depois
disso, as populações retornaram, mas suas práticas de
sobrevivência eram outras, já que a maioria delas criava gado.
A
pesquisa mais recente, de março de 2017, contempla a ideia de que os
seres humanos desempenharam um papel ativo na criação das condições
áridas que existem hoje no Saara.
Segundo
o estudo, existem evidências arqueológicas que documentam que a
primeira aparição do pastoreio no Saara teve efeitos severos sobre
a ecologia da região.
À
medida em que a vegetação era retirada e substituída para acomodar
o gado e os rebanhos, o albedo aumentou e esse efeito influiu nas
condições atmosféricas de modo a reduzir a frequência das chuvas
de monções.
Mas
há uma contraditória nesta teoria, porque embora
exista um consenso de que o crescimento intenso do rebanho de gado
que pasta possa ser prejudicial à variedades
de plantas, o pasto leve e moderado pode ter resultados positivos.
É
certo que no Saara e no Sahel não houve animais domésticos de
pastoreio num período anterior a 8 mil anos, mas havia gnus e outros
animais. Esses animais pastavam e também defecavam ali. Assim,
deixavam a área fertilizada para a sua recuperação quando as
chuvas chegassem.
Reconhece-se
que os humanos possam ter tido alguma influência na desertificação,
mas não era só isso o que estava acontecendo. Os outros fatores
(como mudanças cíclicas, de acordo com a aproximação da Terra do
Sol) já estavam ocorrendo de maneira natural.
O
período do Saara verde não ocorreu apenas entre 5 mil e 10 mil
anos, mas também há 125 mil anos, Naquele período, não houve
interferência humana, mas a transição de úmido para árido. E, se
o fenômeno é cíclico, seria possível supor que o Saara voltará a
ser verde outra vez, embora a atividade humana do mundo moderno tenha
que ser levada em conta.
Concluindo,
daqui a milhares de anos o ciclo se repetirá. O problema agora são
as forças antropogênicas. A influência humana será mais um
efeito, fora da variação natural, que poderá mudar o equilíbrio
no futuro do planeta, não apenas no Saara.